Da quinta ao prato na Taberna Ó Balcão

Foi há 11 anos que abriu o restaurante Taberna Ó Balcão, em Santarém, mas o cozinheiro Rodrigo Castelo continua a abraçar memórias e as tradicionais raízes da cultura local, sempre numa filosofia sustentável.

Nessa altura, já foi na horta do sogro que o fomos ajudar a apanhar e selecionar os melhores tomates, produzidos com amor e sem químicos. Solares, sumarentos, vermelhos, doces e maduros, como o verão. O resultado foi um puro deleite expresso numa sopa e numa salada de estio. Hoje, ainda é a inovação, a criatividade e a experimentação que o motivam, mas o que nos interessa é que continua a sublinhar a ligação à agricultura bio e à sustentabilidade.

No seguimento do que tem vindo a fazer com os peixes do rio, dando importância à sustentabilidade, neste caso preservando o que está em risco de extinção e trabalhando sobretudo os predadores para equilibrar esse ciclo, também em terra a ideia é criar com o que tem aos pés. Daí a parceria com a “Landscape Farm”, de forma a ter sempre à mesa produtos locais e frescos, com a mais-valia de serem de agricultura biológica. “Sendo uma cultura bio cumpre um circuito sustentável, na gestão de água e tratamento dos solos. Sabemos que esses legumes são plantados segundo a cultura biológica. Somos o que comemos e isso faz a diferença”, afirma.

Consegue-se, assim, um ciclo holístico que sublinha um caráter diferenciador.

Os próprios sabores são mais concentrados. “Baseamos muito o nosso trabalho no que a horta nos vai dando, trabalhamos com o que recebemos diariamente do hortelão. Todos os dias de manhã recebo o que há de mais fresco na horta e o desperdício, quando não é zero, é levado de volta para a compostagem”, advoga.

A primeira regra é a sazonalidade, para conseguir a tal sapidez natural dos frutos e legumes, atualizando o conceito “farm-to-table”. Fazer uma sopa com produtos da horta biológica é obter um prato nos antípodas de uma sopa confecionada com legumes e hortícolas produtos de agricultura intensiva.

Se a primeira é um portento de sabor, a segunda é usualmente insípida e deprimente. Quando se traz essa quota parte de responsabilidade para a cozinha, o resultado só pode ser bom.

Isso mesmo se provou num dos pratos da carta de outono do Ó Balcão, alusivamente apelidado de “Horta de outono”, uma sinfonia de legumes onde o nabo gratinado, em camadas, entre puré de alho assado, amêndoa ralada e limão, era envolvido por beterraba amarela, chícharo, gão de bico e cogumelos silvestres, aromatizado com tomilho. Tudo diretamente vindo da horta da “Landscape Farm” (exceto os cogumelos).

O prato mostra como se pode valorizar uma horta no prato. E o que vale é que as novas tendências “vegan” e o recrudescimento da leveza na cozinha dedicada aos legumes e hortícolas parece ser uma porta aberta a uma nova fase, pelo que até o chamado o “vegan fine dining” se tornou num caminho apetecível e cada vez mais presente.

Outra proposta passou por um puré de polpa abóbora com lúcio, levemente fumado, de forma a evocar a memória do fumo aconchegante outonal da lareira, um prato poético e eficaz, já que esta é a segunda espécie mais predadora na cadeia dos peixes de rio. No final, somos nós todos que ganhamos, pois como diz Rodrigo, com razão, “somos o que comemos”.