

Safari Supremo em África do Sul
Um roteiro fascinante explora a savana, o mais belo arquipélago, montanhas majestosas e vinhas históricas da parte sul do continente africano.
- Texto: Fernanda Fehring
- Fotografia: Arquivo
A chegada ao aeroporto de Joanesburgo já faz prever que estamos a desembarcar num país singular. A linda bandeira multicolorida da África do Sul que está por toda parte, representa muitíssimo bem todos os povos que formam o país, apelidado carinhosamente de “nação arco-íris”. A razão do apelido é a multiplicidade de culturas, credos e tons de pele diferentes que a África do Sul exibe em seu território. “Howzit?”, pergunta-nos o gentil funcionário do aeroporto, com um sorriso rasgado – marca registrada dos sul-africanos. “How is it?”- ou “Como está?”- respondo eu, tentando imitar o adorável sotaque local, o que provoca uma gargalhada para lá de simpática no jovem rapaz.
A simpatia, aliás, é o traço mais marcante deste povo tão diverso, e é o que mais nos deixou saudade quando partimos de nossa estadia de quatro (felizes) anos como residentes no país.
Voltar à África do Sul é sempre uma espécie de “retorno ao lar” e o reencontro com um povo que nos ensinou o real significado da palavra hospitalidade. E foi com essa mesma gentileza, que tanto nos encantou, que fomos recebidos pela funcionária da FedAir. Foi ela quem nos conduziu ao bimotor que nos levou em direção ao Kruger Park, a primeira paragem da nossa jornada africana.
Ao sobrevoar a reserva já foi possível observar o maravilhoso cenário, as belas árvores, arbustos e rios. Até que a solitária pista de pouso despontou no horizonte. Chegar ao Kruger para dias de safari é sempre uma emoção. E a reserva de Sabi Sands, uma das mais especiais da região do Grande Kruger, promete as melhores oportunidades para ver os tão aguardados Big Five.
O termo “Grande Kruger” refere-se à área do mundialmente famoso Parque Nacional Kruger e de algumas reservas privadas adjacentes – como Timbavati, Sabi Sands, Klaserie e Balule – que oferecem uma experiência de safari que está entre as melhores da África. Fundado em 1898 por Paul Kruger para proteger a vida selvagem do Lowveld sul-africano, o parque nacional é líder mundial em técnicas e políticas de gestão ambiental. É também o lar de um enorme número de espécies: 336 árvores, 49 peixes, 34 anfíbios, 114 répteis, 507 aves e 147 mamíferos espalhados por uma área de 20.000 quilómetros quadrados. Mas quando o assunto é conservação ambiental e inclusão social, o destaque absoluto vai para o grupo Singita, proprietário do Ebony Lodge, que escolhemos para nos hospedarmos durante o passeio pelo bush sul-africano. O grupo tem a conservação da natureza como paixão e propósito. O primeiro lodge, fundado há 30 anos por Luke Biles, CEO do grupo, nesta mesma área de Sabi Sands, teve como compromisso de longo alcance salvaguardar as populações de animais e as áreas selvagens do continente, bem como criar independência económica nas comunidades que vivem ao lado delas. Através de parcerias estratégicas com fundos e trusts sem fins lucrativos, em cada uma das regiões da África onde o grupo opera, o objetivo foi criar um legado duradouro para o continente, garantindo que a beleza natural e a abundância da África não apenas sobrevivam, mas também floresçam e prosperem. A natureza e o planeta agradecem, e muito.


Mas o compromisso com a proteção ambiental anda de mãos dadas com uma operação hoteleira de excelência, e o grupo destaca-se também pelo alto nível de hospitalidade oferecido nos seus hotéis. O Ebony Lodge não foge a este elevado padrão. A beleza das áreas comuns, das suítes, a excelência do serviço e o nível da gastronomia oferecidos na propriedade encantaram-nos.
As adegas que mantêm nos lodges são um capítulo à parte, e os rótulos especiais, vindos maioritariamente da região de Cape Winelands, são escolhidos a dedo por uma equipa de sommeliers premiados. Mas como o assunto principal por aqui é safari, vamos a isso. Já no nosso primeiro game drive, fomos surpreendidos pela quantidade de animais que encontramos entre os tão desejados big five – termo que designa os animais mais difíceis de serem avistados num safari:

notavelmente, elefantes, leões, búfalos, rinocerontes e leopardos. Estes últimos, os mais difíceis de encontrar – por se esconderem muito bem – são os animais que todos almejam observar, e a região de Sabi Sands é conhecida pela presença certa dos raros felinos.
O esperado encontro com o remanescente dos big five aconteceu no nosso último dia de safari, quando avistámos um único leopardo, sozinho, escondido no meio de uma moita. Tal façanha foi efusivamente celebrada com um braai – o churrasco local – com direito a performances de canto e dança dos funcionários do hotel. Uma forma perfeita de nos despedirmos de dias regados a excelentes vinhos e belos passeios pela natureza selvagem do bush sul-africano.
Arquipélago de Bazaruto
Uma hora de voo levou-nos à nossa próxima paragem, no país vizinho, Moçambique. Mais precisamente, ao extraordinário Arquipélago de Bazaruto – um pequeno pedaço de paraíso no Oceano Índico ao longo da costa da província de Vilankulo.
Parque Nacional Marinho com 55 quilómetros de comprimento, o arquipélago inclui as ilhas de Santa Carolina, Bangué, Benguerra, Magaruque e Bazaruto. Cada uma mais bonita do que a outra, e todas banhadas por águas de vários tons de turquesa, as ilhas são lar de um enorme número de peixes, tartarugas, golfinhos, baleias e dugongos – e de uma grande variedade de vida marinha ameaçada de extinção. O local é famoso mundialmente por ser um dos melhores pontos para mergulho e snorkelling do planeta.
Mas a nossa vinda à região tinha outro objetivo: conhecer o novíssimo e maravilhoso Kisawa Sanctuary, considerado um dos hotéis mais extraordinários da África. Localizado na ponta sul da ilha de Benguerra, o santuário de 300 hectares de florestas, dunas e praias, alberga o hotel que nasceu com um projeto inovador – e foi criado com o intuito de conservar a natureza da região, estudar a vida marinha e ajudar a comunidade local. A intenção aqui foi construir algo que não interferisse na natureza, ou não deixasse uma “marca” num ecossistema tão frágil e intocado.
Construído como o primeiro resort impresso em 3D do mundo, a propriedade foi erguida com o auxílio de uma impressora 3D usando argamassa de areia e água do mar para formar as paredes dos seus 11 bungalows.
A estrutura das casas foi toda organizada em camadas de baixo para cima, usando tecnologia patenteada, que permite que as casas “flutuem” em cima das dunas.
Dentro das espaçosas residências, o que reina é uma decoração de extremo bom gosto com inspiração Bauhaus e objetos com um ar retrô – como uma vitrola e uma coleção de discos em vinil. Do lado de fora, cada bangalô conta com uma estrutura completa, com piscina privativa, sala de almoço e cozinha, e uma longa faixa de areia completamente deserta.
A empresária e designer Nina Flohr, proprietária do hotel, levou cinco anos para desenvolver o admirável projeto, que conta também com um spa independente – o The Natural Wellness Center – que teve o seu design pontiagudo inspirado nas residências tradicionais moçambicanas. O hotel alberga ainda quatro restaurantes, uma piscina de borda infinita, uma loja com artesanato local e um heliponto para auxiliar no transporte (aéreo) entre o hotel e o continente.
As atividades propostas aos hóspedes incluem mergulhos no famoso “Two Mile Reef”, passeios de lancha pelas ilhas vizinhas, trilhas pelas dunas, visita à praia dos flamingos e uma visita ao extraordinário BCSS, ou Bazaruto Center for Scientific Studies – um instituto de pesquisa marinha, também fundado por Nina, que tem como objetivo estudar e proteger os ecossistemas marinhos da África Oriental.
Kisawa, que significa “inquebrável”, é um lugar verdadeiramente espetacular que tem como compromisso construir vínculos entre pessoas e lugar, vida e terra. O cuidado com a natureza e com as comunidades locais é claro em tudo o que está envolvido na existência deste hotel. A criação deste santuário é, antes de mais nada, uma declaração de amor dos seus proprietários pela cultura local e pelo meio ambiente do arquipélago.




Cape Town
Das belas águas e bancos de areia de Benguerra até à Cidade do Cabo, de novo na África do Sul, a mudança de cenário é dramática, mas não menos exuberante. A Cidade do Cabo é daqueles lugares que nunca me canso de visitar. A beleza natural, o clima adorável, a atmosfera animada e a cena gastronómica deliciosa tornam sempre as minhas visitas memoráveis.
Emoldurada pela Table Mountain e pelos Twelve Apostles, a Cidade do Cabo é uma das mais belas paisagens urbanas do mundo – muitas vezes comparada à cidade do Rio de Janeiro. A vista sobre a cidade é deslumbrante e as praias são algumas das mais pitorescas do planeta.
Um lugar tão especial mereceu um hotel à altura, e o nosso escolhido foi o Ellerman House, uma mansão eduardiana em Bantry Bay e um verdadeiro oásis de cultura e elegância.
A propriedade tem como foco homenagear a cultura sul-africana e conta com um acervo de dois séculos de arte local numa renomada coleção de mais de 1.000 obras espalhadas por toda a casa. Na propriedade, há também uma galeria de arte contemporânea com obras de novos talentos do país.
O jardim recheado de espécies de flora nativa é um dos mais bonitos da cidade e conta com terraços voltados para o mar. Até mesmo o restaurante é uma homenagem ao país, com especialidades regionais combinadas com vinhos locais da extraordinária coleção de 7.500 garrafas.
Aliás, os vinhos são levados muito a sério por aqui, com degustações de rótulos locais oferecidas diariamente aos hóspedes, dentro da adega – felizardos que saboreiam belos blends sul-africanos, de frente para um mosaico formado por amostras do solo de cada terroir dos vinhedos locais. Sensacional!
Sair deste hotel magnífico para visitar a cidade é uma tarefa árdua, mas uma paragem em Camps Bay, uma das praias mais bonitas da cidade, e uma visita à Table Mountain valem qualquer esforço.




Cape Winelands
De Cape Town, seguimos pela cinematográfica estrada de Chapman’s Peak – uma das mais dramáticas do mundo – a caminho de Cape Winelands, para fechar a nossa viagem pelo sul da África com chave de ouro. Não haveria lugar melhor do que a região de vinhas sul-africana para terminar uma viagem tão marcante.
O local é um destino de tirar o fôlego, conhecido pelos seus vinhos extraordinários, paisagens cénicas e culinária deliciosa.
Vinhas belíssimas e casas históricas em estilo Cape Dutch enfeitam a área, emoldurada por montanhas majestosas
Três das cidades mais famosas da região de vinhedos são Paarl, Stellenbosch e Franschhoek, cada uma com diferentes características e com o seu charme único. A minha preferida absoluta, a cidade de Franschhoek – que significa “canto francês” – foi estabelecida por refugiados huguenotes no final do século XVII e mantém até hoje um charme gaulês distinto, evidente na sua arquitetura, no seu bom gosto e na cena gastronómica.


O La Clé Lodge, o nosso hotel escolhido na região, não foge ao alto padrão de charme local. Muito pelo contrário, a propriedade é das mais bonitas que já visitei no país. O lodge é parte integral de dois vinhedos, que produzem um ótimo Chardonnay, e está localizado a poucos minutos a pé do coração da cidade. O hotel principal, uma casa em estilo Cape Dutch de capotar de tão bonita, conta com cinco suítes em estilos variados e quatro vilas de uso exclusivo em meio a pomares, jardins de lavanda e vinhedos, muitos vinhedos.
O programa principal para quem visita a cidade tem nome e sobrenome: wine tasting – ou degustação de vinhos – e as vinícolas espalham-se por toda a parte, criando corredores verdes que contrastam lindamente com as montanhas da região.
Mas Cape Winelands oferece também muitas atividades ao ar livre, como cavalgadas e trilhas a pé ou de mountain bike – paixão absoluta do povo sul-africano.
Na estrada de volta até ao aeroporto de Cape Town, as lindas montanhas da região acompanham-nos o tempo todo. A África do Sul é generosa até nisso, brindando-nos com vistas deslumbrantes onde quer que estejamos. A saudade já começa a bater ao apertarmos os cintos de segurança, e o único consolo é saber que levamos um pouco deste continente extraordinário nas (muitas) garrafas de vinho que seguem viagem para casa dentro das nossas malas



