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Em casa com

Maria Manuel Neto

Casa d’Abreu Neto

O projeto das Quatro Casas, em Matosinhos, é a primeira obra construída de Álvaro Siza. Maria Manuel Neto, neta dos primeiros clientes do relevante arquiteto, guia-nos pela Casa d’Abreu Neto, onde nasceu e cresceu, que hoje é palco de visitas e estadias.

  • Texto: Teresa Castro Viana
  • Fotografia: Maria João Gala
06 de Outubro, 2025

Siza, nascido em 1933, é um homem à frente do seu tempo. Sempre o foi. Em 1954, quando ainda estudava Arquitetura na Escola Superior de Belas-Artes, no Porto, o seu primeiro trabalho começou a ganhar vida. A Casa d’Abreu Neto, das icónicas Quatro Casas de Álvaro Siza, em Matosinhos, foi a sua primeira obra construída.

Marca, não apenas, o início da carreira de um dos mais importantes arquitetos contemporâneos, como do estilo de pensamento que o mundo aclama e reconhece. De acordo com a página oficial da Casa d’Abreu Neto, aberta a visitantes e hóspedes, “o projeto revela influências evidentes do Inquérito à Arquitectura Popular (mediado por Fernando Távora), de Le Corbusier e da arquitetura orgânica de Alvar Aalto, referências que viriam a moldar a linguagem própria do arquiteto ao longo das décadas seguintes”.

Maria Fernanda e Fernando Abreu Neto, casados na Igreja do Bom Jesus de Matosinhos, tinham o sonho de construir uma casa de família, mas a vida não lhes estava a sorrir.

“A minha avó fica órfã muito cedo e à incumbência de um avô muito abastado e influente em Matosinhos. Como já era muito idoso, passado uns tempos morre. A viúva, que era muito mais nova, distribui a herança do marido pelos netos e parte dessa herança serve para construir esta casa”, conta Maria Manuel Neto, neta dos proprietários.

Fernanda queria um terreno na Avenida D. Afonso Henriques, perto da igreja – “era muito devota” –, pertença de um primo, e Fernando conseguiu esse negócio. Como era bastante grande, no lugar de uma foram construídas quatro casas: uma para o jovem casal, outra para Óscar, irmão de Fernanda, e mais duas para a viúva do avô que, embora não tivesse filhos, tinha duas sobrinhas a seu cargo.

Assim, nascem duas habitações unifamiliares e duas geminadas.

E foi Siza, na altura com 21 anos, ainda estudante, que ficou responsável pelo projeto d’As Quatro Casas.

Maria Manuel Neto

"O meu avô foi abordado pelo tio do arquiteto Siza. Disse-lhe que tinha um sobrinho a estudar arquitetura que queria começar a fazer qualquer coisa para ganhar algum dinheiro e experiência.”

Maria Manuel Neto

A oportunidade foi dada e o projeto, pago em três prestações de 3500 escudos, começou em 1954.

“O meu avô, pelo feitio que tinha, delegava tudo à minha avó. Ela é que tomava as decisões, era a matriarca e a pessoa que passava mais tempo em casa”.

Ela desenhava no papel e na cabeça o que desejava e ele assentia. Fernanda queria uma casa luminosa, espaçosa – eram quatro, mas “gostava de receber muita gente” –, uma janela voltada para a porta principal e uma varanda muito grande.

Na planta original, a sala de visitas tinha uma porta de correr e, para a avó de Maria Manuel, “não fazia sentido”.

erguntava-se onde colocaria os sofás, as vitrines para as louças… também não queria escadas de pedra, como as das casas rústicas da aldeia, difíceis de lavar. Claro está, preocupações de uma dona de casa. Siza fervilhava de ideias, mas Fernanda servia de travão.

As exigências foram cedidas pelo então estudante, que lhes entregou uma maquete do projeto – as fotos estão afixadas na parede da sala de visitas. Nele falava-se em “inovações na carpintarias e madeiras exóticas; ferragens e candeeiros desenhados pelo próprio arquiteto; pastilha de vidro ocre; uma chaminé escultórica e um passa-pratos da cozinha para a sala de jantar; um degrau em granito e bancadas em mármore; varanda de dez metros; corrimão ergonómico em ferro”.